Pinceladas às avessas — Resenha de Caroline de Lara (UEPG/UFS) sobre o livro “O fascismo da cor: uma radiografia do racismo nacional”, de Muniz Sodré

Muniz Sodré | Imagem: Carta Capital

Resumo: O fascismo da cor: uma radiografia do racismo nacional, de Muniz Sodré, objetiva analisar o racismo brasileiro pós-abolicionista. A obra é criticada por omitir discussões sobre racismo religioso e fascismo, além de tratar superficialmente temas complexos, apesar de ser considerada útil para movimentos sociais e estudo do racismo.

Palavras-chave: Racismo, Racismo Brasileiro, Fascismo.


O fascismo da cor: uma radiografia do racismo nacional é um compêndio cronológico que problematiza a construção e manutenção do racismo em meio a diversas transformações mundiais. Nesta obra, o autor visa demonstrar as diversas características, formas e manifestações do racismo brasileiro pós-abolicionista. O livro, de 280 páginas, foi publicado em 2023 pela Editora Vozes — Petrópolis/RJ.

Muniz Sodré de Araújo Cabral (1942 -) nasceu em São Gonçalo dos Campos-BA, é sociólogo, jornalista, tradutor, professor titular da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), escritor e pesquisador de mídia e comunicação, cultura nacional, técnicas de texto jornalístico e ficção, com livros traduzidos em italiano e espanhol. Em O fascismo da cor, o autor ressalta que o racismo brasileiro é produto do pós-abolição, coadunando com a emergência do fascismo europeu, com destaque para a forma social escravista praticada até a atualidade. É passível de verificação que tal trabalho foi publicado no primeiro semestre de 2023, devido à emergência de debates no que tange às configurações do racismo nacional, ante à disseminação de considerações, principalmente sobre o racismo estrutural. O livro é constituído por prólogo e 4 capítulos.

No prólogo, o autor versa sobre as características do processo de Independência das 13 Colônias, da Constituição Federal norte americana, Guerra Civil Americana e da formação dos Estados Unidos, ressaltando as ações de segregação racial. Tecendo uma linha histórica bíblica sobre a crença racista a respeito da origem dos povos africanos, originada da maldição de Cam e consolidada pelo imaginário social cristão europeu, o autor afirma que essa é a base acimentada do racismo na América, que vê o outro como o inimigo e que esse inimigo sempre será o negro. Dessa forma, a leucocracia, que é o poder oriundo do privilégio branco, é exercida de forma ampla, respaldada e amparada pela erudição, pelo poder e suas leis, e pelo senso comum, tornando fértil o terreno para ações e dominações supremacistas. Nesse primeiro momento, Muniz Sodré concretizou o que se dispôs a realizar no prólogo, que foi uma abordagem histórica sobre o racismo americano, apesar de realizá-la (inconscientemente) numa configuração da longa duração braudeliana.

No capítulo primeiro, o pesquisador destaca que diferente do caso norte americano, no Brasil, por se tratar de um país de baixa cultura republicana e oriundo das relações sociais das famílias oligárquicas e latifundiária. A concepção do Brasil enquanto empresa gerou no senhor de engenho o poder e controle sobre a produção econômica açucareira e a mão de obra escrava. A construção desse capítulo deixa transparecer uma lacuna histórica não abordada por Sodré, quando o mesmo faz abordagens no contexto do pós-abolição, no qual a sociedade brasileira seria a “sociedade do “encobrimento”, no sentido de uma formação social orientada para o apagamento do que houve antes” (p. 23).

Em uma leitura um pouco mais atenta, é possível verificar a réplica desse fato na própria obra, caracterizando, assim, uma incoerência autoral muito evidente, pois em vários momentos o autor desconsidera importantes contextos vivenciados pelos africanos escravizados no Brasil. Aqui, poderia ser o momento de explicitar que tivemos ações do povo preto na constituição do Brasil, antes da Abolição, vide o Quilombo dos Palmares, a Revolta dos Malês e, até mesmo, as formas de apagamento proposital das diversas identidades dos povos africanos que foram alvo do racismo engendrado desde o século XVI.

Também no capítulo primeiro, o pesquisador critica o uso errôneo do termo “racismo estrutural”, difundido por Sílvio Almeida em obra homônima (2018). Muniz Sodré enfatiza que durante a constituição do Brasil República, suas estruturas foram criadas para não exercer funcionamento, logo não há lógica no emprego do termo “racismo estrutural”, pois, partindo desse pressuposto, o racismo não seria vigente em terras brasileiras até a atualidade. Contudo, Sodré comete contradição em sua escrita ao negar o uso do termo racismo estrutural, pautando seu discurso pelo viés estrutural.

Ao fim do capítulo, o autor faz uma abordagem lacônica, sobre o Código Penal brasileiro de 1890, no que tange à proibição das práticas do espiritismo. Ele remete à presença do racismo religioso no Brasil e destaca a Eugenia como um dos elementos principais na constituição do racismo cultural, perpetuado em nosso cenário atual nacional.

No capítulo segundo, Sodré discute sobre a estrutura escravista com um a abordagem conteudista, embasado por personagens históricos do Brasil e por teóricos da Sociologia, Filosofia e História, entre outros campos. Cita momentos do cotidiano dos escravizados, destacando de forma resumidíssima os fatos religiosos ocorridos no Rio de Janeiro, à contrapelo do movimento dos ritos cristãos. Também discute as práticas religiosas africanas, relacionadas por Nina Rodrigues a problemas mentais e, por outros autores, como manifestação folclórica. Tanto os autores citados como o próprio Sodré não as consideram práticas ritualísticas, ancestrais e religiosas.

Nesse capítulo, o autor afirma ainda que o racismo antinegro é o mais antigo que existe, embora tal fenômeno estivesse presente no início da exploração europeia, quando deuses africanos foram demonizados para fragilizar a seguridade, identidade e as práticas religiosas dos povos bantos e jejes. O autor finaliza o segmento com a declaração de que a sociedade nacional frequentemente se recusa a tratar o racismo como fenômeno presente nas mais diversas estruturas sociais.

No capítulo terceiro, Sodré explana sobre a presença da forma social escravista. Ele afirma que a forma social escravista não é uma ideologia. Trata-se, segundo o autor, de forma de vida. Sodré enfatiza a ambiguidade interna da forma social escravista, ao citar de modo sucinto o fascismo e os discursos acadêmicos de Nina Rodrigues, Sílvio Romero e Monteiro Lobato. Haveria, segundo o autor, um espécie de racismo “à brasileira”, pois tais intelectuais foram contraditórios ao expressar as qualidades dos povos negros e, ao mesmo tempo, defenderem teorias raciais e o branqueamento da raça. No decorrer do capítulo, o autor emprega alguns termos que podem incomodar ao leitor mais atento, quando faz referência às personalidades nacionais pretas, usando o “assumidamente negro” para caracterizar pessoas como Guerreiro Ramos (p. 83) e Joaquim Barbosa. Qual a necessidade de destacar essas pessoas com tal termo e excluir outras como Luiz Gama e Luiza Mahin?

O capítulo quarto é dedicado à crítica à esquerda brasileira, sempre protegida por livros e estantes e indiferente à realidade cotidiana do racismo. Novamente, em pinceladas eruditas, cita momentos em que o povo preto nunca foi o foco. Na sequência, o pesquisador realiza uma tentativa infrutífera de epítome das evidências históricas do racismo no Brasil. Para tanto, aborda conceitos como “raça” e “biopoder” de forma superficial, estabelecendo relações com a Linguística para analisar a palavra “preconceito”. Empregando a expressão “sociedade neoliberal”, destaca que o racismo nacional é “mais uma lógica de lugar do que de sentido” (p. 154).

No posfácio, o autor faz uso de autores das mais diversas áreas do conhecimento para debater a forma brasileira racista, que é antagônica ao racismo estrutural americano. Ele destaca a branquitude, oriunda da leucocracia e brancura como item de negociação.

Infelizmente, apenas nesse final da obra, o autor tece considerações sucintas sobre povos africanos, a exemplo dos “nagôs” e os bantos, para enfatizar um debate em torno da negociação simbólica reflexo do racismo brasileiro.

Mãe Menininha do Gantois | Imagem: Acervo do Terreiro do Gantois/BBC Brasil

Ao término do posfácio, o especialista declara que o racismo não deve ser abordado em uma perspectiva nietzschiana da história monumental, considerando apenas os grandes personagens históricos. Ao contrário, afirma o autor, deve-se optar pela problematização do fenômeno em sua historicidade.

Neste livro, o autor não cumpre o que fora anunciado, pois, se levarmos em consideração o título da obra, perceberemos que alguns temas necessários estão ausentes, a exemplo do racismo religioso em sua vigência anterior à diáspora. Também está ausente uma abordagem ampla e detalhada de fatos históricos, sociológicos, antropológicos, filosóficos, educacionais entre outros, que constituíram vários séculos de formação brasileira. Por fim, é insuficiente a discussão sobre o “fascismo”, transparecendo um uso puramente comercial do termo. Apesar dessas omissões, o livro é útil à formação de pessoas inseridas nos movimentos sociais e a interessados em obter um arcabouço teórico para refutar estudos e defesas que visam combater o racismo brasileiro.

Referências

DOMINGUES, Petrônio. Fascismo da cor versus racismo estrutural. Correio Brasiliense. Brasília, jun. 2023. Disponível em <https://www.correiobraziliense.com.br/opiniao/2023/06/amp/5100800-artigo-fascismo-da-cor-versus-racismo-estrutural.html>. Acesso em: 20 jun. 2023.

MORAES, Maxwell Azevedo Viana. A Construção da Falácia: teorias raciais e o processo de anulação da teogonia africana. Boletim do Tempo Presente. São Cristóvão, v.10, n.09, p. 49-51., Set. 2021.

Sumário de O fascismo da cor: uma radiografia do racismo nacional

  • Prólogo – Homo americanos
  • 1. O nacional brasileiro
  • 2. Da estrutura à forma
  • 3. Contradição e ambiguidade
  • 4. A passagem ao ato racista
  • Posfácio
  • Referências

Para ampliar a sua revisão da literatura


Resenhista

Caroline de Lara é mestra em História, Cultura e Identidades e graduada em História pela Universidade Estadual de Ponta Grossa/Paraná (UEPG). É professora da rede privada de ensino em Aracaju/SE e técnica administrativa da Universidade Federal de Sergipe. Entre outros trabalhos, publicou Da gênese ao caos: A resistência como testemunha ocular (2022). ID LATTES: http://lattes.cnpq.br/3064912647511582. ID ORCID: https://orcid.org/0009-0008-3301-1685; E-mail: carohistoriadora@gmail.com.

 


Para citar esta resenha

SODRÉ, Muniz. O fascismo da cor: uma radiografia do racismo nacional. Petrópolis: Vozes, 2023. 280p. Resenha de: LARA, Caroline de. Pinceladas às avessas. Crítica Historiográfica. Natal, v.4, n.15, jan./fev., 2024. Disponível em <https://www.criticahistoriografica.com.br/pinceladas-as-avessas-resenha-de-caroline-de-lara-uepg-ufs-sobre-o-livro-o-fascismo-da-cor-uma-radiografia-do-racismo-nacional-de-muniz-sodre/>.


© – Os autores que publicam em Crítica Historiográfica concordam com a distribuição, remixagem, adaptação e criação a partir dos seus textos, mesmo para fins comerciais, desde que lhe sejam garantidos os devidos créditos pelas criações originais. (CC BY-SA).

 

Crítica Historiográfica. Natal, v.4, n. 15, jan./fev., 2024 | ISSN 2764-2666

Pesquisa/Search

Alertas/Alerts

Pinceladas às avessas — Resenha de Caroline de Lara (UEPG/UFS) sobre o livro “O fascismo da cor: uma radiografia do racismo nacional”, de Muniz Sodré

Muniz Sodré | Imagem: Carta Capital

Resumo: O fascismo da cor: uma radiografia do racismo nacional, de Muniz Sodré, objetiva analisar o racismo brasileiro pós-abolicionista. A obra é criticada por omitir discussões sobre racismo religioso e fascismo, além de tratar superficialmente temas complexos, apesar de ser considerada útil para movimentos sociais e estudo do racismo.

Palavras-chave: Racismo, Racismo Brasileiro, Fascismo.


O fascismo da cor: uma radiografia do racismo nacional é um compêndio cronológico que problematiza a construção e manutenção do racismo em meio a diversas transformações mundiais. Nesta obra, o autor visa demonstrar as diversas características, formas e manifestações do racismo brasileiro pós-abolicionista. O livro, de 280 páginas, foi publicado em 2023 pela Editora Vozes — Petrópolis/RJ.

Muniz Sodré de Araújo Cabral (1942 -) nasceu em São Gonçalo dos Campos-BA, é sociólogo, jornalista, tradutor, professor titular da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), escritor e pesquisador de mídia e comunicação, cultura nacional, técnicas de texto jornalístico e ficção, com livros traduzidos em italiano e espanhol. Em O fascismo da cor, o autor ressalta que o racismo brasileiro é produto do pós-abolição, coadunando com a emergência do fascismo europeu, com destaque para a forma social escravista praticada até a atualidade. É passível de verificação que tal trabalho foi publicado no primeiro semestre de 2023, devido à emergência de debates no que tange às configurações do racismo nacional, ante à disseminação de considerações, principalmente sobre o racismo estrutural. O livro é constituído por prólogo e 4 capítulos.

No prólogo, o autor versa sobre as características do processo de Independência das 13 Colônias, da Constituição Federal norte americana, Guerra Civil Americana e da formação dos Estados Unidos, ressaltando as ações de segregação racial. Tecendo uma linha histórica bíblica sobre a crença racista a respeito da origem dos povos africanos, originada da maldição de Cam e consolidada pelo imaginário social cristão europeu, o autor afirma que essa é a base acimentada do racismo na América, que vê o outro como o inimigo e que esse inimigo sempre será o negro. Dessa forma, a leucocracia, que é o poder oriundo do privilégio branco, é exercida de forma ampla, respaldada e amparada pela erudição, pelo poder e suas leis, e pelo senso comum, tornando fértil o terreno para ações e dominações supremacistas. Nesse primeiro momento, Muniz Sodré concretizou o que se dispôs a realizar no prólogo, que foi uma abordagem histórica sobre o racismo americano, apesar de realizá-la (inconscientemente) numa configuração da longa duração braudeliana.

No capítulo primeiro, o pesquisador destaca que diferente do caso norte americano, no Brasil, por se tratar de um país de baixa cultura republicana e oriundo das relações sociais das famílias oligárquicas e latifundiária. A concepção do Brasil enquanto empresa gerou no senhor de engenho o poder e controle sobre a produção econômica açucareira e a mão de obra escrava. A construção desse capítulo deixa transparecer uma lacuna histórica não abordada por Sodré, quando o mesmo faz abordagens no contexto do pós-abolição, no qual a sociedade brasileira seria a “sociedade do “encobrimento”, no sentido de uma formação social orientada para o apagamento do que houve antes” (p. 23).

Em uma leitura um pouco mais atenta, é possível verificar a réplica desse fato na própria obra, caracterizando, assim, uma incoerência autoral muito evidente, pois em vários momentos o autor desconsidera importantes contextos vivenciados pelos africanos escravizados no Brasil. Aqui, poderia ser o momento de explicitar que tivemos ações do povo preto na constituição do Brasil, antes da Abolição, vide o Quilombo dos Palmares, a Revolta dos Malês e, até mesmo, as formas de apagamento proposital das diversas identidades dos povos africanos que foram alvo do racismo engendrado desde o século XVI.

Também no capítulo primeiro, o pesquisador critica o uso errôneo do termo “racismo estrutural”, difundido por Sílvio Almeida em obra homônima (2018). Muniz Sodré enfatiza que durante a constituição do Brasil República, suas estruturas foram criadas para não exercer funcionamento, logo não há lógica no emprego do termo “racismo estrutural”, pois, partindo desse pressuposto, o racismo não seria vigente em terras brasileiras até a atualidade. Contudo, Sodré comete contradição em sua escrita ao negar o uso do termo racismo estrutural, pautando seu discurso pelo viés estrutural.

Ao fim do capítulo, o autor faz uma abordagem lacônica, sobre o Código Penal brasileiro de 1890, no que tange à proibição das práticas do espiritismo. Ele remete à presença do racismo religioso no Brasil e destaca a Eugenia como um dos elementos principais na constituição do racismo cultural, perpetuado em nosso cenário atual nacional.

No capítulo segundo, Sodré discute sobre a estrutura escravista com um a abordagem conteudista, embasado por personagens históricos do Brasil e por teóricos da Sociologia, Filosofia e História, entre outros campos. Cita momentos do cotidiano dos escravizados, destacando de forma resumidíssima os fatos religiosos ocorridos no Rio de Janeiro, à contrapelo do movimento dos ritos cristãos. Também discute as práticas religiosas africanas, relacionadas por Nina Rodrigues a problemas mentais e, por outros autores, como manifestação folclórica. Tanto os autores citados como o próprio Sodré não as consideram práticas ritualísticas, ancestrais e religiosas.

Nesse capítulo, o autor afirma ainda que o racismo antinegro é o mais antigo que existe, embora tal fenômeno estivesse presente no início da exploração europeia, quando deuses africanos foram demonizados para fragilizar a seguridade, identidade e as práticas religiosas dos povos bantos e jejes. O autor finaliza o segmento com a declaração de que a sociedade nacional frequentemente se recusa a tratar o racismo como fenômeno presente nas mais diversas estruturas sociais.

No capítulo terceiro, Sodré explana sobre a presença da forma social escravista. Ele afirma que a forma social escravista não é uma ideologia. Trata-se, segundo o autor, de forma de vida. Sodré enfatiza a ambiguidade interna da forma social escravista, ao citar de modo sucinto o fascismo e os discursos acadêmicos de Nina Rodrigues, Sílvio Romero e Monteiro Lobato. Haveria, segundo o autor, um espécie de racismo “à brasileira”, pois tais intelectuais foram contraditórios ao expressar as qualidades dos povos negros e, ao mesmo tempo, defenderem teorias raciais e o branqueamento da raça. No decorrer do capítulo, o autor emprega alguns termos que podem incomodar ao leitor mais atento, quando faz referência às personalidades nacionais pretas, usando o “assumidamente negro” para caracterizar pessoas como Guerreiro Ramos (p. 83) e Joaquim Barbosa. Qual a necessidade de destacar essas pessoas com tal termo e excluir outras como Luiz Gama e Luiza Mahin?

O capítulo quarto é dedicado à crítica à esquerda brasileira, sempre protegida por livros e estantes e indiferente à realidade cotidiana do racismo. Novamente, em pinceladas eruditas, cita momentos em que o povo preto nunca foi o foco. Na sequência, o pesquisador realiza uma tentativa infrutífera de epítome das evidências históricas do racismo no Brasil. Para tanto, aborda conceitos como “raça” e “biopoder” de forma superficial, estabelecendo relações com a Linguística para analisar a palavra “preconceito”. Empregando a expressão “sociedade neoliberal”, destaca que o racismo nacional é “mais uma lógica de lugar do que de sentido” (p. 154).

No posfácio, o autor faz uso de autores das mais diversas áreas do conhecimento para debater a forma brasileira racista, que é antagônica ao racismo estrutural americano. Ele destaca a branquitude, oriunda da leucocracia e brancura como item de negociação.

Infelizmente, apenas nesse final da obra, o autor tece considerações sucintas sobre povos africanos, a exemplo dos “nagôs” e os bantos, para enfatizar um debate em torno da negociação simbólica reflexo do racismo brasileiro.

Mãe Menininha do Gantois | Imagem: Acervo do Terreiro do Gantois/BBC Brasil

Ao término do posfácio, o especialista declara que o racismo não deve ser abordado em uma perspectiva nietzschiana da história monumental, considerando apenas os grandes personagens históricos. Ao contrário, afirma o autor, deve-se optar pela problematização do fenômeno em sua historicidade.

Neste livro, o autor não cumpre o que fora anunciado, pois, se levarmos em consideração o título da obra, perceberemos que alguns temas necessários estão ausentes, a exemplo do racismo religioso em sua vigência anterior à diáspora. Também está ausente uma abordagem ampla e detalhada de fatos históricos, sociológicos, antropológicos, filosóficos, educacionais entre outros, que constituíram vários séculos de formação brasileira. Por fim, é insuficiente a discussão sobre o “fascismo”, transparecendo um uso puramente comercial do termo. Apesar dessas omissões, o livro é útil à formação de pessoas inseridas nos movimentos sociais e a interessados em obter um arcabouço teórico para refutar estudos e defesas que visam combater o racismo brasileiro.

Referências

DOMINGUES, Petrônio. Fascismo da cor versus racismo estrutural. Correio Brasiliense. Brasília, jun. 2023. Disponível em <https://www.correiobraziliense.com.br/opiniao/2023/06/amp/5100800-artigo-fascismo-da-cor-versus-racismo-estrutural.html>. Acesso em: 20 jun. 2023.

MORAES, Maxwell Azevedo Viana. A Construção da Falácia: teorias raciais e o processo de anulação da teogonia africana. Boletim do Tempo Presente. São Cristóvão, v.10, n.09, p. 49-51., Set. 2021.

Sumário de O fascismo da cor: uma radiografia do racismo nacional

  • Prólogo – Homo americanos
  • 1. O nacional brasileiro
  • 2. Da estrutura à forma
  • 3. Contradição e ambiguidade
  • 4. A passagem ao ato racista
  • Posfácio
  • Referências

Para ampliar a sua revisão da literatura


Resenhista

Caroline de Lara é mestra em História, Cultura e Identidades e graduada em História pela Universidade Estadual de Ponta Grossa/Paraná (UEPG). É professora da rede privada de ensino em Aracaju/SE e técnica administrativa da Universidade Federal de Sergipe. Entre outros trabalhos, publicou Da gênese ao caos: A resistência como testemunha ocular (2022). ID LATTES: http://lattes.cnpq.br/3064912647511582. ID ORCID: https://orcid.org/0009-0008-3301-1685; E-mail: carohistoriadora@gmail.com.

 


Para citar esta resenha

SODRÉ, Muniz. O fascismo da cor: uma radiografia do racismo nacional. Petrópolis: Vozes, 2023. 280p. Resenha de: LARA, Caroline de. Pinceladas às avessas. Crítica Historiográfica. Natal, v.4, n.15, jan./fev., 2024. Disponível em <https://www.criticahistoriografica.com.br/pinceladas-as-avessas-resenha-de-caroline-de-lara-uepg-ufs-sobre-o-livro-o-fascismo-da-cor-uma-radiografia-do-racismo-nacional-de-muniz-sodre/>.


© – Os autores que publicam em Crítica Historiográfica concordam com a distribuição, remixagem, adaptação e criação a partir dos seus textos, mesmo para fins comerciais, desde que lhe sejam garantidos os devidos créditos pelas criações originais. (CC BY-SA).

 

Crítica Historiográfica. Natal, v.4, n. 15, jan./fev., 2024 | ISSN 2764-2666

Resenhistas

Privacidade

Ao se inscrever nesta lista de e-mails, você estará sujeito à nossa política de privacidade.

Acesso livre

Crítica Historiográfica não cobra taxas para submissão, publicação ou uso dos artigos. Os leitores podem baixar, copiar, distribuir, imprimir os textos para fins não comerciais, desde que citem a fonte.

Foco e escopo

Publicamos resenhas de livros e de dossiês de artigos de revistas acadêmicas que tratem da reflexão, investigação, comunicação e/ou consumo da escrita da História. Saiba mais sobre o único periódico de História inteiramente dedicado à Crítica em formato resenha.

Corpo editorial

Somos professore(a)s do ensino superior brasileiro, especializado(a)s em mais de duas dezenas de áreas relacionadas à reflexão, produção e usos da História. Faça parte dessa equipe.

Submissões

As resenhas devem expressar avaliações de livros ou de dossiês de revistas acadêmicas autodesignadas como "de História". Conheça as normas e envie-nos o seu texto.

Pesquisa


Enviar mensagem de WhatsApp